sexta-feira, 21 de junho de 2013

Engenharia da vida



Imagem: http://www.sandravandoornillustrations.com

desisto, Vida,
de tentar entender
porque pessoas tão queridas
vão embora não pela morte,
mas por seus próprios pés,
partindo nossos corações
em mil pedaços,
desisto, Vida,
de tentar entender
porque temos que chamar de amigo
a quem quiséramos poder chamar
de meu amor,
desisto, Vida,
de tentar entender
porque choramos pelos
que partem sem motivo,
e ninguém é colocado no lugar,
que nos proporcione a mesma alegria,
discordo, Vida,
quando dizem que
quando uma porta se fecha,
abrem-se janelas,
atesto, Vida,
que portas são fechadas,
janelas negam em se abrir,
deixando-nos imersos por longo
e longo tempo,
no escuro de um reduto triste
e opressor,
declaro, Vida, que não sei lidar
com a dureza dos corações humanos
e tremo só de pensar
que possa ser eu a deixar em prantos
alguém que me pediu tão pouco,
apenas umas palavras,
a presença vez por outra,
ou um pequeno acalanto,
afirmo, Vida,
que não acredito em meios amores
nem em meias amizades,
e quem,
sem motivo nos abandona,
sem mensurar em quantos pedaços
partirá nosso coração,
nunca foi nosso amor
e também nunca foi nosso amigo,
insisto, Vida,
em afirmar que há formas
e formas
de amar sem aprisionar
e que duas almas podem se gostar
sem que jamais tenham se tocado,
porque a matéria envelhece
mas a mente e o coração
não envelhecem jamais,
e concluo, Vida,
que a desnutrição contínua da matéria
pode matar rapidamente,
mas a desnutrição permanente
no terreno das afeições
causa morte lenta e dolorosa,
porquanto contraria as leis da natureza
que nos projetou para dar e receber
amor e carinho,
ainda que em pequenas porções,
e cobro de você, Vida,
uma explicação:
porque nos dá o dom do amor
e da afeição em tão altas doses,
se nos fecha todos os canais
pelos quais eles deveriam escoar?

terça-feira, 11 de junho de 2013

Saudade




Meu Deus... só o Senhor poderá avaliar a dor em meu peito, tamanha a saudade que se apossou de mim.
É difícil estar sem a presença de quem esteve comigo um dia, edificando ao meu lado momentos de luz e felicidade. É difícil não chorar lágrimas de um desconsolo que teimosamente me faz recordar.
Já sei muito de Ti e de teus desígnios, meu Pai, e no entanto minha alma agora parece refratária a qualquer pensamento sensato. Como eu queria poder exclamar resignadamente "seja feita a tua vontade", porém não consigo mais calar palavras aflitas que me queimam o cérebro rogando uma resposta que seja, mas que me sirva de explicação e de consolo...
Por quê, Senhor?
Por que primeiro os sonhos e as esperanças, a presença e a promessa e depois o choque, a dor e o vazio?
Ah, meu Deus... Ontem, em um tempo onde só havia espaço para risos e ideais, eu vivia entre promessas e afagos, cercada de afetos que eram toda a minha alegria e toda a minha esperança!...
Mas hoje, eu pergunto: onde se encontra a filha que colocaste em minha vida, tornando-a jardim de rara e delicada formosura?
Hoje, saudades e descaminhos marcam minha passagem no mundo, legando-me soluços e mãos estendidas, como que a perguntar: por quê, Senhor, por quê? Em que lugar de minha estrada eu te devia tanto, que levaste a minha Marcela de mim, deixando-me sozinha entre o silêncio e a dor...
Perdoe-me as lágrimas, meu Pai, o desconsolo... Sei que não estou assim agora, por acaso, e por isso procurei-Te, voltando-me para o teu amor infinito na esperança de uma palavra amiga, de uma resposta que me traga compreensão e alívio!
Ajude-me a entender estas separações. Ajude-me a suportar as saudades e as lágrimas nas horas de inconformação, para que eu possa retribuir, mesmo que com a minha humilde e sofrida resignação perante o inevitável, o imenso amor que dela recebi nos momentos mais doces da minha existência!
Assim seja!

segunda-feira, 10 de junho de 2013

A morte é também um começo



Pergunta a Osho:
Eu tenho medo da morte, no entanto, ao mesmo tempo, ela exerce uma atração inexplicável sobre mim. O que isso significa?
A morte é o maior mistério da vida. A vida tem muitos mistérios, mas não existe nada que se compare à morte. A morte é o clímax, o crescendo. A pessoa tem medo dela porque ela ficará perdida, ela se dissolverá nela.
Ela tem medo da morte por causa do ego — o ego não pode sobreviver à morte. Ele ficará nesta margem quando você passar para a outra; ele não pode ir com você. E o ego é tudo o que você sabe sobre si mesmo, daí o medo, o grande medo: "Eu não existirei mais depois de morrer."
Mas existe uma grande atração também. O ego você perderá, mas não a sua realidade. Na verdade, a morte lhe revelará a sua verdadeira identidade; ela levará embora todas as máscaras e revelará a sua face original.
A morte tornará possível, pela primeira vez, que você encontre o seu âmago mais profundo, a sua subjetividade mais profunda assim como ela é, sem nenhuma camuflagem, sem nenhum fingimento, sem nenhuma personalidade falsa. Por isso é que todo mundo tem medo da morte e se sente atraído por ela.
Essa atração foi mal interpretada por Sigmund Freud, que achou que havia um desejo de morte no ser humano — ele o chamou de Thanatos. Ele dizia, "O homem tem dois instintos básicos, fundamentais; um é Eros — um desejo profundo de viver, de viver para sempre, um desejo pela imortalidade — e o outro é Thanatos, o desejo de morrer, de acabar com tudo".
Ele não entendeu o espírito da coisa, pois ele não era um místico; ele só conhecia uma face da morte — que ela é o fim da vida —, ele só sabia uma coisa: que a morte é o fim. Ele não se deu conta de que a morte é também um começo.
Todo fim é somente um começo, porque nada acaba totalmente. Nada pode jamais acabar. Tudo continua, só a forma muda. A sua forma morrerá, mas você também tem algo sem forma em você. O seu corpo não existirá mais, mas você tem algo aí dentro, dentro do seu corpo, que não faz parte do seu corpo.
A sua parte terrena voltará à terra, é pó sobre pó, mas você tem algo do céu em você, algo do além, que empreenderá uma nova jornada, uma nova peregrinação. A morte causa medo se você pensar no ego, e ela agrada você, atrai você, se você pensar no seu verdadeiro eu.
Então a pessoa sente uma vaga atração pela morte; se você ficar totalmente consciente dela, ela pode se tornar uma compreensão transformadora, pode se tornar uma força de mutação.
Procure entender tanto o medo quanto a atração. E não pense que eles sejam opostos — eles não se sobrepõem, eles não são opostos um do outro; eles não interferem um no outro. O medo está voltado para uma direção: o ego; e a atração está voltada para uma dimensão totalmente diferente: o eu destituído de ego.
E a atração é muito mais importante do que o medo. O praticante de meditação tem de superar o medo. Ele tem de se apaixonar pela morte, tem de convidar a morte — o praticante de meditação não tem de esperar por ela, ele tem de evocá-la, pois a morte é uma amiga para ele.
E o praticante de meditação morre antes do corpo. E essa é uma das mais belas experiências da vida: o corpo continua vivendo, externamente você continua vivendo como sempre, mas interiormente o ego não existe mais, o ego morreu.
Agora você está vivo e morto ao mesmo tempo. Você se tornou um ponto de encontro entre a vida e a morte; você contém agora os opostos polares e é grande a riqueza quando os dois opostos polares estão presentes.
E esses são grandes opostos polares, a vida e a morte. Se abarca ambos, você será capaz de abarcar Deus, pois Deus é ambos. Uma face de Deus é a vida, a outra face é a morte.
Isso é belo — não torne isso um problema.
Medite a respeito, faça disso uma meditação e você será imensamente beneficiado.
Osho, em "O Livro do Viver e do Morrer: Celebre a Vida e Também a Morte"

domingo, 9 de junho de 2013

A morte não existe


A morte é uma simples mudança de estado, a destruição de uma forma frágil que já não proporciona à vida as condições necessárias ao seu funcionamento e à sua evolução. Para além da campa, abre-se uma nova fase de existência. O Espírito, debaixo da sua forma fluídica, imponderável, prepara-se para novas reencarnações, acha no seu estado mental os frutos da existência que findou.
Por toda parte se encontra a vida. A Natureza inteira mostra-nos, no seu maravilhoso panorama, a renovação perpétua de todas as coisas. Em parte alguma há a morte, como, em geral, é considerada entre nós; em parte alguma há o aniquilamento; nenhum ente pode perecer no seu princípio de vida, na sua unidade consciente. O Universo transborda de vida física e psíquica. Por toda parte o imenso formigar dos seres, a elaboração de almas que, quando escapam às demoradas e obscuras preparações da matéria, é para prosseguirem, nas etapas da luz, a sua ascensão magnífica.
A vida do homem é como o Sol das regiões polares durante o estio. Desce devagar, baixa, vai enfraquecendo, parece desaparecer um instante por baixo do horizonte. É o fim, na aparência; mas, logo depois, torna a elevar-se, para novamente descrever a sua órbita imensa no céu.
A morte é apenas um eclipse momentâneo na grande revolução das nossas existências; mas, basta esse instante para revelar-nos o sentido grave e profundo da vida. A própria morte pode ter também a sua nobreza, a sua grandeza. Não devemos temê-la, mas, antes, nos esforçar por embelezá-la, preparando-se cada um constantemente para ela, pela pesquisa e conquista da beleza moral, a beleza do Espírito que molda o corpo e o orna com um reflexo augusto na hora das separações supremas. A maneira por que cada qual sabe morrer é já, por si mesma, uma indicação do que para cada um de nós será a vida do Espaço.
Há como uma luz fria e pura em redor da almofada de certos leitos de morte. Rostos, até aí insignificantes, parecem aureolados por claridades do Além. Um silêncio imponente faz-se em volta daqueles que deixaram a Terra. Os vivos, testemunhas da morte, sentem grandes e austeros pensamentos desprenderem-se do fundo banal das suas impressões habituais, dando alguma beleza à sua vida interior. O ódio e as más paixões não resistem a esse espetáculo. Ante o corpo de um inimigo, abranda toda a animosidade, esvai-se todo o desejo de vingança. Junto de um esquife, o perdão parece mais fácil, mais imperioso o dever.
Toda morte é um parto, um renascimento; é a manifestação de uma vida até aí latente em nós, vida invisível da Terra, que vai reunir-se à vida invisível do Espaço. Depois de certo tempo de perturbação, tornamos a encontrar-nos, além do túmulo, na plenitude das nossas faculdades e da nossa consciência, junto dos seres amados que compartilharam as horas tristes ou alegres da nossa existência terrestre. A tumba apenas encerra pó. Elevemos mais alto os nossos pensamentos e as nossas recordações, se quisermos achar de novo o rastro das almas que nos foram caras.
Não peçais às pedras do sepulcro o segredo da vida. Os ossos e as cinzas que lá jazem nada são, ficai sabendo. As almas que os animaram deixaram esses lugares, revivem em formas mais sutis, mais apuradas. Do seio do invisível, onde lhes chegam as vossas orações e as comovem, elas vos seguem com a vista, vos respondem e vos sorriem. A Revelação Espírita ensinar-vos-á a comunicar com elas, a unir os vossos sentimentos num mesmo amor, numa esperança inefável.
Muitas vezes, os seres que chorais e que ides procurar no cemitério estão ao vosso lado. Vêm velar por vós aqueles que foram o amparo da vossa juventude, que vos embalaram nos braços, os amigos, companheiros das vossas alegrias e das vossas dores, bem como todas as formas, todos os meigos fantasmas dos seres que encontrastes no vosso caminho, os quais participaram da vossa existência e levaram consigo alguma coisa de vós mesmos, da vossa alma e do vosso coração. Ao redor de vós flutua a multidão dos homens que se sumiram na morte, multidão confusa, que revive, vos chama e mostra o caminho que tendes de percorrer.
Ó morte, ó serena majestade! Tu, de quem fazem um espantalho, és para o pensador simplesmente um momento de descanso, a transição entre dois atos do destino, dos quais um acaba e o outro se prepara. Quando a minha pobre alma, errante há tantos séculos através dos mundos, depois de muitas lutas, vicissitudes e decepções, depois de muitas ilusões desfeitas e esperanças adiadas, for repousar de novo no teu seio, será com alegria que saudará a aurora da vida fluídica; será com ebriedade que se elevará do pó terrestre, através dos espaços insondáveis, em direção àqueles a quem estremeceu neste mundo e que a esperam.
Para a maior parte dos homens, a morte continua a ser o grande mistério, o sombrio problema que ninguém ousa olhar de frente. Para nós, ela é a hora bendita em que o corpo cansado volve à grande Natureza para deixar à Psique, sua prisioneira, livre passagem para a Pátria Eterna.
Essa pátria é a Imensidade radiosa, cheia de sóis e de esferas. Junto deles, como há de parecer raquítica a nossa pobre Terra. O Infinito envolve-a por todos os lados. O infinito na extensão e o infinito na duração, eis o que se nos depara, quer se trate da alma, quer se trate do Universo.
Assim como cada uma das nossas existências tem o seu termo e há de desaparecer, para dar lugar a outra vida, assim também cada um dos mundos semeados no Espaço tem de morrer, para dar lugar a outros mundos mais perfeitos.
Dia virá em que a vida humana se extinguirá no Globo esfriado. A Terra, vasta necrópole, rolará, soturna, na amplidão silenciosa.
Hão de elevar-se ruínas imponentes nos lugares onde existiram Roma, Paris, Constantinopla, cadáveres de capitais, últimos vestígios das raças extintas, livros gigantescos de pedra que nenhum olhar carnal voltará a ler. Mas, a Humanidade terá desaparecido da Terra somente para prosseguir, em esferas mais bem dotadas, a carreira de sua ascensão. A vaga do progresso terá impelido todas as almas terrestres para planetas mais bem preparados para a vida. É provável que civilizações prodigiosas floresçam a esse tempo em Saturno e Júpiter; ali se hão de expandir humanidades renascidas numa glória incomparável. Lá é o lugar futuro dos seres humanos, o seu novo campo de ação, os sítios abençoados onde lhes será dado continuarem a amar e trabalhar para o seu aperfeiçoamento.
No meio dos seus trabalhos, a triste lembrança da Terra virá talvez perseguir ainda esses Espíritos; mas, das alturas atingidas, a memória das dores sofridas, das provas suportadas, será apenas um estimulante para se elevarem a maiores alturas.
Em vão a evocação do passado, lhes fará surgir à vista os espectros de carne, os tristes despojos que jazem nas sepulturas terrestres. A voz da sabedoria dir-lhes-á: “Que importa as sombras que se foram! Nada perece. Todo ser se transforma e se esclarece sobre os degraus que conduzem de esfera em esfera, de sol em sol, até Deus”. Espírito imorredouro, lembra-te disto: “A morte não existe”.
(Leon Denis - Do livro “O Problema do Ser, do Destino e da Dor”)